Experiência Cristã
Em primeiro lugar, nem sentimentos nem experiências constituem base pela
qual se possa julgar a espiritualidade. Nenhum dos efeitos que aparecem quando
o Espírito está presente com poder, tais como lágrimas, tremores, gemidos,
desmaios, etc., são apresentados nas Escrituras como indicadores de fé
ou do favor de Deus. Nem visões grandiosas ou fortes emoções por si mesmas
estabelecem alguma coisa sobre nossas relações com Deus. Quando as multidões
viram Jesus curando o paralítico, elas glorificaram o Deus de Israel (Mc 2.12;
Mt 9.8; Lc 5.26; Mt 15.31), e quando Jesus ensinou nas sinagogas foi
glorificado por todos (Lc 4.15; 7.16). Assim mesmo, onde estavam essas pessoas
quando ele foi crucificado? Segundo observa Edwards, o fato de uma pessoa orar
ou de falar com entusiasmo sobre Deus durante certo tempo não significa muita
coisa em si mesmo. O homem natural é capaz de ter as mais admiráveis visões de
Deus e de ter os mais profundos sentimentos religiosos e assim mesmo se afastar
disso com o coração inalterado. O valor da experiência religiosa é limitado por
sua incapacidade de fazer o que é mais necessário, transformar permanentemente
o coração do homem. Conforme diz Edwards: "Um homem pode ter dez mil
revelações e orientações do Espírito de Deus e assim mesmo não possuir nem um
pouquinho da graça em seu coração". A questão é importante, pois isso
significa que precisamos ter cuidado para não julgar nossa condição espiritual
ou a de alguém baseados em experiências, pois elas simplesmente não são
confiáveis como indicadores da condição espiritual de uma pessoa.
Em segundo lugar, quando há uma atuação incomum do Espírito num contexto
de grupo, é essencial que a ordem seja mantida ou restaurada, e a Palavra,
pregada. Pense novamente nos avivamentos de Neemias 8 e de Atos 2. Nos dois
casos as multidões ficaram temporariamente agitadas pela atuação do Espírito e
reagiram com profundas emoções. Se a situação se resumisse a isso, pouca coisa
seria realizada. Mas o texto de Neemias deixa claro que Esdras e Neemias
restauraram a ordem e continuaram o estudo das Escrituras (vv. 8,12,13). Em
conseqüência disso, o avivamento continuou através do capítulo 9. O mesmo
ocorreu em Atos 2, em que todos na multidão ficaram "atônitos e perplexos"
com as manifestações do Espírito (vv. 6,7,12). Mas Pedro falou mais alto que o
barulho e ofereceu uma exposição do significado da morte e da ressurreição de
Cristo. A multidão ouviu o que ele tinha a dizer (v. 37), e o resultado disso
foi que 3.000 pessoas foram salvas. Para que haja algum resultado de valor
permanente numa experiência, é preciso que a desordem dê lugar à ordem e que a
Palavra seja ensinada e pregada.
Por último, experiências religiosas de êxtase não devem ser vistas como o
coração da espiritualidade cristã. Deus não chama os cristãos a buscarem
experiências espirituais cada vez mais grandiosas para seu próprio bem, não
importa quão elevadas ou santas elas sejam. Jack Deere, líder do movimento de
sinais e maravilhas nos Estados Unidos, faz uma boa colocação disso:
Quando Deus se agrada em conceder manifestações físicas hoje, devemos
aceitá-las como vindas de suas mãos, mas não devemos cometer o erro de
glorificá-las. [...] Em última análise, o que tem importância real não é a
manifestação, mas a obra do Espírito.
Voltando
depois à mesma questão, ele acrescenta que o propósito de todas as
manifestações do Espírito "é produzir pessoas saudáveis que vivam a vida
integralmente para Deus". É exatamente isso. O cristão não deve ter como
alvo de sua vida a busca de experiências espirituais, mas servir a Deus por
meio de boas obras. A isso acrescentaria que na Bíblia há muitos exemplos de
homens e mulheres sobre quem não se registra nenhuma experiência especial.
Entre eles estão o servo anônimo de Abraão (Gn 24.2,3), o General Calebe (Nm
14.24), Neemias, o restaurador de Jerusalém, Apolo, o grande mestre (At
18.24-28), Dorcas, a amada costureira (At 9.36-38), e Timóteo, o grande
discípulo de Paulo (At 18.5; 1 Co 4.17; Fp 2.22; 1 Ts 3.2). Sem dúvida há muitos
outros. Eles constituem prova de que uma posição elevada com Deus tem mais que
ver com um serviço fiel do que com experiência.
Alan B.
Pieratt
Alan B.
Pieratt, Ph.D., missionário da C. B. International, mesma missão do Dr. Shedd,
é professor de Teologia Sistemática na Faculdade Teológica Batista de São
Paulo.
Comentários
Postar um comentário